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poesia

Conversa nº5 – Leonardo Marona
encontrei leo num momento difícil do dificílimo ano de 2018. na semana anterior victor heringer tinha feito a passagem e um ou dois dias depois marielle seria assassinada. cheguei na livraria da travessa de botafogo mais pro final da tarde quase noite. conversamos ali dentro, numa espécie de jardim de inverno muito utilizado pelos fumantes, eu acho. leo joga nas onze e já publicou livros de poesia, conto e romance. além disso, é o cantor da Dibuk Motel e trabalha há anos como livreiro
Como minha vó me ensinou
como minha vó ensinou acordo todas as manhãs e rezo ajoelho em qualquer que seja o leito e me vejo em toda dor que me caiba no peito então os joelhos são ardidos quase sempre encardidos mas eu não eu não fiz nada
Conversa nº4 – Adelaide Ivánova
esta entrevista foi feita em dois dias diferentes, com pouco mais de uma semana de diferença entre eles. no dia 31 de julho de 2018, ano da morte de marielle e da queima do museu nacional, encontrei adelaide ivanova em berlim, onde tinha ido para visitar minha mãe. no dia mais quente do ano, fomos, junto com naomi baranek e victinho vasconcellos, ao krumme lanke, um famoso lago da cidade, e talvez o mais agradável de todos. sentamos na areia e, depois de um mergulho, começamos a conversar.
Alguns poemas
sem internet na cidade capital do sol. com chuva. há dias. organizar os pensamentos questão de v1d4 ou morte. sob risco. apalpar as urgências, mesmo criá-las novas e de novo. a cabeça debaixo d`água numa piscina azul que reluta aceitar a condição de bacia e transborda. as bordas. mais de 1 minuto debaixo dágua tentativa e erro. submersão abrutalhada respiração feita do parto escute - o som é iletrável - puxe o ar com força e susto-agora. impressão de nascer de novo sob o contorno de outras águas.
epígrafe
quem de ferro fere o fogo quem de quase fura o corpo qual carícia em tempo firme qual malícia escapa à sorte
Dois poemas
Canta a Deusa às Musas invertidas A cólera de Lethes, a moderna filha: Museográfica flama, ars do passado, Da ruína da história, um esquecimento Da Memória.
Poema de Bianca Pataro
o silêncio é uma estrada e a distância cavada pelo vazio é intransponível cada passo dado é um desvio entre frases suspensas, traçado de fuga aberto em picadas na longa vertigem erguida pelo nada dito
Dois poemas
só falaria deles em frente a todos que pudessem ouvir pra minha sorte senhorzinho era mudo quisesse ouvi-lo teria de olhá-lo quisesse olhá-lo acabei por desejar surdez mas senhorzinho enxergava que era uma beleza
Três poemas
o sossego do meu pai quando, nas manhãs de chuva ou de sol, separa as sementes enquanto, sentado no rio, observa o fluir rasteiro e redondo das águas, a voz serena e ruidosa da água.
Guilherme Zarvos
Há ou havia um crime Que já não se diz, talvez lírico Demais – flor ou projétil: Patas no peito – o som Do tambor: roleta russa Em têmporas
Considerações sobre o poeta dormindo
Além de tudo, porém, uma observação se faz necessária: a poesia não está no sono, no sentido em que ele constitua um reservatório, do qual, em sucessivas descidas, o poeta nos aporte os materiais de seu lirismo. O sono predispõe à poesia.
Poemas não recolhidos em livro pelo autor
De inexplicáveis ânsias prisioneiro Hoje entrei numa forja, ao meio-dia. Trinta e seis graus à sombra. O éter possuía A térmica violência de um braseiro. Dentro, a cuspir escórias.
há sinais no sol
há sinais no sol — convulso — além da conta na lua tão perigosamente próxima alucinado mar em ondas gigantes terra que geme e se contorce ...
Corpos onde a cidade se repete
Corpos onde a cidade se repete: (depois de derramar antigas bocas sobre outra água): quase elidem alguns órgãos alarmados — em meio às ferragens — no casulo do calendário? ...
Poemas
O antônimo de gaveta é folha Porque a gaveta é um corpo que se guarda para dentro no escuro do segredo ...
em meio de cipós de algodão e feixes solares cai nu – no mar onde o barco bêbado jamais navegou...
Faca
Com um pedaço de faca é possível talhar uma casa é possível talhar uma porta um poço um poema eu você dois espelhos refletindo o espaço vazio da sala o gato dormindo sobre a estante eu você sorrindo sempre ...
eco
A cabeça um fervo, mistura de afeto piadas que perdem qualquer lastro com a graça da quebra inicial - cesura no claustro - e continuam no embalo, no frevo, já na sua terceira, quarta variação modal ...
Poesia de Esquina – Entrevista com Viviane de Salles

“Ter uma vida culturalmente ativa é muito caro. Então, o que é o acesso à cultura? A gente não tá fazendo sarau porque a gente quer ter acesso à cultura, a gente é a própria cultura. A gente tá invertendo uma parada. A gente quer ter acesso a tudo, tudo que é produzido."

mangue
é pouca a luz e eu aproveito pra te pedir que percorra o teu mangue que disseque com os pés o pavor do real e só então diga da casa das janelas dos relógios das posturas ...
O que os vivos fazem
Jão, a pia da cozinha tá entupida há dias, algum talher deve ter caído lá dentro. E o dreno não funciona mas fede, e a louça imunda se empilhou esperando pelo encanador que eu ainda não chamei. Esse é o dia a dia de que falávamos.
A temporada dos dinossauros
antes que ele bata eles abrem a porta e se entra com a bota borrada de barro e lama eles trazem logo o melhor tapete da casa enquanto ele nos fala sonhos de grandeza ...
Editoras Independentes – EP 02
Neste segundo episódio da web-série Editoras Independentes, perguntamos à Azougue, Oito e Meio, Cozinha Experimental e Oficina Raquel sobre a trajetória de cada editora, as possibilidades abertas pelas novas tecnologias, alternativas de distribuição de livros em pequenas tiragens e relação com os autores.
Mãepai
Pai, te devolvo meu olhos pois cansaram de juntar tanta luz derramada sem fundamento sobre terra fugaz. Mãe, te entrego meus cabelos que o vento liberou daquele sulco escuro em meu pensamento.
Chiado
escuta bem: já ouviu um disco daqueles de vinil? o ruído, o chiado o zumbido que faz após a última faixa é o disco dizendo que chegou ao fim ...
Foto de Prisca Agustoni
"Esse dilema do processo de criação é uma outra maneira de ressaltarmos a tensão 'enraizerrante', que confere à experiência poética a possibilidade de dizer-nos que aquilo que nos fixa no tempo e no espaço, na vida pessoal e coletiva só o faz porque se move e se transfigura continuamente."
sebastós
se andamos como lestrigões cortando o céu amarelo e o asfalto estriado se somos como lestrigões e o mundo passa rápido ...
Editoras Independentes – EP 01
Neste primeiro episódio da web-série Editoras Independentes, perguntamos à Azougue, Oito e Meio, Cozinha Experimental e Oficina Raquel sobre o que significa ser uma editora independente, o papel do editor, a relação entre editoras independentes, as dificuldades do mercado e as diferenças frente às grandes editoras.
vê
vê ao longe o adesivo de prioridade descolando da parede opaca do metrô onde empurram como uma onda de carne e ar que me impede o futuro...
Para acabar com o julgamento de Deus
Texto-poesia retirado de uma transmissão radiofônica realizada por Antonin Artaud (como autor e narrador) e por alguns de seus amigos (Roger Blin, Marie Casarès e Paule Thévenin) que além de narrarem o ajudaram na produção dos efeitos sonoros durante a transmissão.
hoje Deus me falou
hoje Deus me falou: a barragem rompeu! estamos passando por um momento de transformação não é nada pessoal o ano tá foda pra todo mundo ...
pequena história real
na cidade grande não se divide eram três irmãos um mais velho advogado um mais novo advogado uma criança que queria ser advogada por causa do pai que também era advogado mas imagine senhor que na cidade grande não se divide ...
Assêmico-Panssêmico
"O todo de um texto ou desenho aparece diante de nós como uma 'coisa' assêmica, indecifrável para o intelecto, que não reconhece a linguagem; mas, ao mesmo tempo, pode ser significativo (e, sim, belo) para o ... gosto, percepção ... solicitando algum tipo de empatia."
poema besta
I olho um pouco acima do ombro e tento localizar o exato do teu ritmo, a tua ininterrupta geografia - como se num dia de agosto a praia compensasse os temores, amenizasse os anseios.
Melany
Será mesmo outra sessão? (the big brother [circa 1943]), a enfermeira com estilhaços além da própria visão, cuida das próprias feridas como se fossem de uma outra que tem a morte nas mãos e diz que a noite não demora muito à forçar os seres adentro de si ...
Um manifesto, nem isso
Hoje é o aniversário da execução de García Lorca e se alguma coisa mudou desde então, foi pra pior eu estou na Central do Brasil esperando que alguém me ligue com uma notícia boa ...
Poemas
quantas coisas acontecem numa tarde mas como cortam a luz da casa pena de pássaro oculto no meio da sala sem luz na casa temores tecer uma lastra de palavras e nada teus poemas para levar à morte por abrir tudo o que não posso a casa aos vagabundos essa ausência de clareza que nos arrasta
conceição
eu apago a luz do jardim e fecho as persianas a lagoa lá longe com suas colunas de luz e a moldura das árvores que sucessivas gerações ...
Móbile
quanto do tempo daqui até o teu sexo abrir jardins e fazer caminho de abelha vindo do mar abrir um livro e penar sobre o teu pássaro e não morrer ali ...
IV
Às vezes, quando choro, procuro um sobrepeso qualquer no corpo, um distúrbio qualquer no rastro.  O baque e todos nós na beira do caminho, em conformidade com as rochas que não conseguem subtrair os próprios esforços...
em meio ao nevoeiro
em meio ao nevoeiro as estrelas explodiam no universo do meu peito tua galáxia distante se aproximava na velocidade da luz o tempo não existe nem importa ...
O fogo
no retorno à linguagem primitiva o poeta faz a condição: maneja a alquimia conhece os mistérios das plantas a eficácia da magia.