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Arte Individual

Individuell Konst

1918

maio, 2020

Apresentação

O nome Edith Södergran deve soar estranho para ouvidos brasileiros. É desconhecido em todos os seus sentidos: tanto por não se saber quem é essa Edith como também pela fonética estranha, bizarra e até engraçada desse nome sueco. Edith, vindo do inglês Eadgyth, significa « guerreiro orgulhoso », enquanto Södergran diz, em sueco, « pinheiro do sul ». A pessoa Edith Södergran não é uma sueca típica, mas representa bem o seu nome. Em sentido poético, foi uma guerreira orgulhosa da taiga, pertencente aos pinheiros do sul: sempre buscando alcançar novos horizontes com as suas frases, palavras e imagens. Sueco-finlandesa, nasceu no dia 4 de abril de 1892 em São Petersburgo, território russo. Estudou na escola alemã de moças, a Höhere Mädschenschule da Deutsche Hauptschule zu St. Petri. A instituição acolhia estudantes de várias nacionalidades, o que tornou Södergran fluente em várias línguas. Além de finlandês e sueco, suas línguas maternas, a poeta também falava fluentemente russo, alemão e francês.

Infelizmente, a vida de Edith foi marcada por vários eventos trágicos, em permanente encontro com a morte. Por volta de 1904 (não se sabe exatamente), sua irmã é atropelada por um trem e pouco tempo depois, em 1907, seu pai contrai tuberculose e também morre. A doença, aliás, atinge Edith um ano depois, o que a faz abandonar os estudos aos 16 anos. Entre 1911 e 1914 fica internada em um sanatório em Davos-Dorf, na Suíça, mostrando uma significativa melhora durante o tratamento. Muda-se, então, com a mãe para Raivola (hoje Roschino, na Rússia), mas a doença se agrava gradualmente e Edith morre no dia 24 de junho de 1923, um solstício de verão. A data é de grande importância no Norte, já que celebra a vida e a fecundidade da terra.

Em 1916, Edith estreou como poeta com a coleção de poemas Dikter [Poemas]. Depois vieram em 1918, Septemberlyran [A lira de setembro], em 1919, Rosenaltaret [Altar de rosas] e a coleção de aforismos Atenções esparsas, aqui traduzidos, e em 1920, Framtidens skugga [A sombra do futuro]. Convocando um ideal, gerando arrepios, a sua autoria toca o leitor de maneira amena e atrevida. Como boa modernista, influenciada pelo simbolismo francês, o expressionismo alemão e o futurismo russo, ela consegue fazer o leitor aceitar o mundo em que o Eu cria e se cria incansavelmente. A combinação desses três movimentos, o simbolismo servindo a expressão da ideia, o expressionismo visando a reorganização da vida do homem e suas condições e o futurismo fascinado pelo mundo moderno e seu dinamismo, velocidade e energia de máquinas e urbanismo, aparece para nós nas frases concisas e diretas de Södergran. Sua obra inclui vários temas: alguns poemas transmitem uma impressão fugidia, outros, preocupações metafísicas. Contudo, um tema recorrente em seus escritos é a preparação para a morte, que assume várias faces: angustiada, apaziguada e esperada.

Após a Revolução Russa, os recursos econômicos de Edith e de sua mãe, assegurados na Ucrânia, perdem todo valor. Na primavera de 1918, quando publica seu segundo livro, o istmo da Carélia era uma zona de guerra. O horror das pessoas sendo executadas em Petrogrado (nome que então recebeu a cidade de São Petersburgo) imprimiu em Edith a imagem de uma violência sangrenta da vida. Nesse momento, encontra na filosofia de Friedrich Nietzsche, e em suas ideias de criatividade e do ideal do novo homem, a coragem de manter-se segura numa vida degradante. Em 31 de dezembro do mesmo ano, Södergran envia uma carta intitulada « Arte Individual » para o jornal de língua sueca baseado em Helsinki, Dagens Press¹. Considerada o primeiro manifesto modernista escrito por uma mulher, a carta apresentava a postura de Edith frente à poesia e suas intenções com os poemas de Septemberlyran [A lira de setembro], recém-lançados. Entretanto, em vez de esclarecer as visões de Edith frente aos críticos, a carta acabou por provocar o primeiro debate na língua sueca sobre a poesia modernista – vista na época como « incompreensível ». Em razão desse episódio, tornou-se amiga da jovem Hagar Olsson, que mais tarde seria uma das vozes críticas literárias mais poderosas do modernismo finlandês. Apesar disso, durante sua vida, Södergran foi mais criticada do que aclamada. Foi somente em 1925, após o lançamento de Landet som icke är [A terra que não é], que conquistou o reconhecimento de ser o primeiro e mais importante nome da lírica sueca moderna. Suas experiências poéticas apresentam um eu fictício e literário, nietzschiano e modernista. Nietzscheano enquanto uma estratégia de criação da sua própria origem, de propriedade sobre o seu destino e de capacidade de formar mundos. E modernista enquanto consciente e orgulhoso de si, testemunhado igualmente por uma consciência e estratégia da política das mulheres da época, isto é, um ativismo para o sufrágio universal.

Aqui, algumas fotos de autoria da poeta:


Arte Individual

“Este livro [A lira de setembro] não é destinado ao público, muito menos aos círculos intelectuais mais elevados, mas somente aos poucos indivíduos que estão mais pertos da fronteira do futuro. […] O novo se mostra claramente [nos poemas] em “Sou uma mentirosa”, “Trem do futuro” e o último fragmento. Desses poemas emerge um fogo mais supremo, uma paixão mais poderosa do que aquela não somente da obra de arte do meu passado. Não posso ajudar quem não sente que é o sangue selvagem do futuro que pulsa nestes poemas.

“Denna bok är inte avsedd för publiken, knappast ens för de högre intellektuella kretsarna, endast för de få individer som stå närmast framtidens gräns. […] Det nya framträder klart i ”Är jag en lögnare”, ”Framtidens tåg” och det sista fragmentet. Ur dessa dikter strömmar en högre eld, en mäktigare lidelse än icke endast ur mitt förflutnas konstverk. Jag kan icke hjälpa den som icke känner att det är framtidens vilda blod som pulserar i dessa dikter.

O fogo interior é o mais importante que o ser humano possui. A terra pertence aos que dentro de si carregam a música suprema. Eu me volto para os raros indivíduos e os convido a aumentar sua música interior, e também a construir um futuro.

Den inre elden är det viktigaste människan äger. Jordklotet tillhör dem som inom sig bära den högsta musiken. Jag vänder mig till de sällsynta individerna och uppmanar dem att höja sin inre musik, detsamma som att bygga på framtiden.

Também sacrifico cada átomo da minha força para o meu elevado objetivo, vivo a vida do santo, me aprofundo no que o espírito humano mais supremo gerou, evito todas as influências de arte mais baixa. Observo a sociedade antiga como a célula materna, que deveria ser cuidada até os indivíduos viajarem para o mundo novo. Convido os indivíduos a só trabalharem para a imortalidade (uma expressão falsa), a fazerem o máximo possível de si mesmo – a se colocarem a serviço do futuro.

Jag offrar själv varje atom av min kraft för mitt höga mål, jag lever helgonets liv, jag fördjupar mig i det högsta människoanden frambragt, jag undviker alla inflytelser av lägre art. Jag betraktar det gamla samhället som modercellen, som bör stödjas till dess individerna resa den nya världen. Jag uppmanar individerna att arbeta endast för odödligheten (ett falskt uttryck), att göra det högsta möjliga utav sig själva – att ställa sig i framtidens tjänst.

Meu livro não terá falhado em seu objetivo se um único individuo conseguir ver o desconhecido nesta arte. Estou feliz por ter escrito esses poemas; não há medida com qual se possa medir a amplitude do favor que a editora me fez ao lançá-los. Novos tempos estão chegando. O que Hemmer conjura no frontispício de seu poema “O pilar”, agora prepara-se na realidade. Espero que eu não esteja sozinha com o grande que tenho para buscar.”

Min bok skall icke hava förfelat sitt mål om en enda individ får syn på det oerhörda i denna konst. Jag är säll att hava gjort dessa dikter; det finnes intet mått med vilket man kan mäta vidden av den tjänst förlaget gjort mig i det det givit ut dem. Nya tider stunda. Vad Hemmer frambesvärjer i sin dikt ”Pelaren”, förbereder sig i verkligheten. Jag hoppas att jag icke blir ensam med det stora jag har att hämta.” (”Individuell Konst”, Dagens Press: 31/12/1918)

¹Literalmente “imprensa do dia” , isto é, o jornal do dia.

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