Texto-poesia retirado de uma transmissão radiofônica realizada por Antonin Artaud (como autor e narrador) e por alguns de seus amigos (Roger Blin, Marie Casarès e Paule Thévenin) que além de narrarem o ajudaram na produção dos efeitos sonoros durante a transmissão.
POUR EN FINIR AVEC LE JUGEMENT DE DIEU¹
Para acabar com o julgamento de Deus
Kré
Kré |
Il faut que tout
É necessário que tudo isso |
puc te
puc te |
kré
kré |
soit rangé
seja organizado |
puk te
puk te |
pek
pek |
à un poil près
exatamente |
li le li le |
kre
kre |
dans un ordre
em uma ordem |
pec ti le
pec ti le |
e
e |
fulminant
fulminante |
kruk
kruk |
pte
pte |
SOUBE ONTEM
(devo estar atrasado ou talvez seja apenas um boato, um desses sujos rumores, como ele se propaga entre a pia e os sanitários na hora em que a ação de se colocar os baldes de refeições são mais uma vez ingeridos),
Soube ontem
uma das práticas oficiais mais sensacionais das escolas públicas americanas
e que fazem sem dúvida que este país se considere à frente no progresso.
Aparentemente, dentre os exames ou provas submetidos a uma criança que entra pela primeira vez em uma escola pública, haveria o teste assim chamado “do líquido seminal ou do esperma”,
e que consistiria em pedir a esta criança recém–chegada um pouco de seu esperma a fim de que o
mesmo seja inserido em uma proveta
e de tê-lo assim pronto para todas as tentativas de inseminação artificial que poderiam vir a acontecer em seguida.
Pois cada vez mais os americanos acham que eles carecem de braços e de crianças,
ou seja, não de operários
mas sim de soldados
e eles querem a todo custo e por todos os meios possíveis fazer e fabricar soldados
com vista a todas as guerras planetárias que poderiam travar-se ulteriormente
e que seriam destinadas a demonstrar pelas virtudes esmagadoras da força a superexcelência dos produtos americanos,
e dos frutos do suor americano em todos os campos da atividade e do dinamismo possível da força.
Porque é necessário produzir,
é necessário, por todos os meios possíveis da atividade, substituir a natureza onde quer que ela possa ser substituída,
é necessário encontrar para a inércia humana um campo maior,
é necessário que o operário tenha do que se empregar,
é necessário que novos campos de atividades sejam criados
onde reinarão finalmente todos os falsos produtos fabricados,
de todos os ignóbeis sucedâneos sintéticos
onde a bela natureza real não tem mais objetivo
e deve ceder de uma vez por todas e vergonhosamente seu lugar a todos os triunfantes produtos de substiuição
onde o esperma de todas as usinas de fecundação artificial operará milagres
para produzir exércitos e navios de combate.
Não haverá mais frutos, nem mais árvores, nem mais vegetais, nem mais plantas farmacológicas ou não e, conseqüentemente, não haverá mais alimentos,
mas sim haverá produtos sintéticos o bastante,
nos vapores,
nos humores especiais da atmosfera, sobre eixos particulares de atmosferas extraídas à força e sinteticamente da resistência de uma natureza que da guerra nunca conhecera nada além do medo.
E viva a guerra, não é?
Pois é, não é, fazendo isso, a guerra, que os Americanos se prepararam e que se prepara assim
passo a passo.
Para defender essa insensata usinagem contra todas as competições que não saberiam perder de
por todos os lados para se levantar,
são necessários soldados, exércitos, aviões, navios de guerra, dos quais este esperma
a respeito do qual parece que os governos da América tiveram a insolência de pensar.
Pois nós temos mais de um inimigo
e que nos vigia, meu filho,
nós, os capitalistas natos
e dentre esses inimigos
a Rússia de Stalin
à qual tampouco faltam braços armados.
Tudo isso está muito bem
mas eu não sabia que os americanos eram um povo tão guerreiro.
Para se bater é preciso receber golpes
e eu talvez tenha visto muitos Americanos na guerra
mas eles sempre tinham diante de si imensuráveis exércitos de tanques, de aviões, de navios de
combate,
que lhes serviam de escudo.
Eu vi muitas máquinas combatendo
mas vi apenas lá no infinito
atrás
os homens que as conduziam.
Diante do povo que dá de comer a seus cavalos, a seu gado e a seus asnos as últimas toneladas de
verdadeira morfina que poderiam lhes restar para substituí–la por produtos sucedâneos de fumaça,
eu gosto mais do povo que come no próprio chão o delírio de onde nasceu,
refiro–me aos Taraumaras
comendo o Peiote ao nível do chão
enquanto ele nasce,
e que mata o sol para instaurar o reino da noite negra
e que esmaga a cruz a fim de que os espaços do espaço nunca mais possam se reencontrar nem se cruzar.
É assim que vocês irão ouvir a dança de TUTUGURI.
TUTUGURI
O Rito de Sol Negro
E lá embaixo, como se no pé da encosta amarga,
cruelmente desesperada do coração,
abre-se o círculo das seis cruzes
bem embaixo
como se incrustada na terra amarga,
desincrustada do imundo abraço da mãe
que baba.
A terra do carvão negro
é o único lugar úmido
nessa fenda de rocha.
O Rito é que o novo sol passa através de sete pontos antes de explodir no orifício da terra.
E há seis homens
um para cada sol
e um sétimo homem
que é o sol todo cru
vestido de negro e de carne vermelha.
Ora, este sétimo homem
é um cavalo,
um cavalo com um homem que o conduz.
Mas é o cavalo
que é o sol
e não o homem.
No dilaceramento de um tambor e de uma trombeta longa
estranha,
os seis homens
que estavam deitados
enrolados rente ao chão,
brotavam sucessivamente como girassóis,
não sóis porém solos que giram²,
lótus d’água,
e cada brotamento
corresponde ao gongo cada vez mais sombrio
e refreado
do tambor
até que de repente a toda velocidade vê-se chegar a grande galope,
com uma rapidez vertiginosa
último sol,
o primeiro homem,
o cavalo negro com um
homem nu,
absolutamente nu
e virgem
sobre ele.
Tendo saltado, eles avançam suavemente em círculos crescentes
e o cavalo em carne sangrando empina-se
e corcoveia sem parar
no pico de sua rocha
até que os seis homens
tenham conseguido cercar
completamente
as seis cruzes.
Ora, o tom maior do Rito é precisamente
A ABOLIÇÃO DA CRUZ
Tendo conseguido girar
eles arrancam
as cruzes do chão
e o homem nu
sobre o cavalo
ergue
uma enorme ferradura
que ele mergulha no sangue de uma punhalada
A BUSCA DA FECALIDADE
Lá onde cheira-se a merda
cheira–se o ser
O homem poderia muito bem não cagar,
não abrir a bolsa anal
mas ele escolheu cagar
assim como teria escolhido viver
em vez de consentir viver morto.
É por não fazer cocô
ele teria que consentir
em não ser,
mas ele não foi capaz de se decidir a perder o ser,
ou seja, a morrer vivo.
Existe no ser
alguma coisa particularmente tentadora para o homem
e esta coisa vem a ser justamente
O COCÔ.
Para existir basta abandonar-se ao ser
mas para viver
é preciso ser alguém
é preciso ter um osso,
é preciso não ter medo de mostrar o osso
e de perder a carne passando
O homem sempre preferiu a carne
à terra dos ossos
Como só havia a terra e a madeira de ossos
foi a ele necessário ganhar sua carne,
só havia o ferro e o fogo
e nenhuma merda
e o homem teve medo de perder a merda
e, por ela, sacrificou o sangue.
Para ter a merda,
ou seja, a carne
lá onde só havia o sangue
e ossos de sucata
e onde não havia mais nada para ganhar
mas onde havia apenas algo para perder, a vida.
o reche modo to edire
di za
tau dari
do padera coco
Lá o o homem recuou e fugiu.
E então os animais o comeram.
Não foi uma violação,
ele prestou–se à obscena refeição.
Ele gostou disso
e também aprendeu até
a agir como animal
e a comer o rato
delicadamente.
E de onde vem essa abjeção à sujeira?
Do fato de o mundo ainda não estar formado
ou de o homem ter apenas uma vaga idéia do que seja o mundo
querendo conservá-la eternamente?
Deve-se ao fato de o homem
um belo dia
ter detido
a idéia do mundo.
Duas rotas estavam diante dele:
a do infinito de fora
a do ínfimo de dentro.
E ele escolheu o ínfimo de dentro.
Lá onde basta espremer
o rato,
a língua,
o ânus,
ou a glande.
E deus, o próprio deus, pressionou o movimento.
É deus um ser?
Se o for, é merda
Se não o for um
não é.
Ora, ele não existe
a não ser como o vazio que avança com todas as suas formas
cuja mais perfeita imagem
é o avanço de um incalculável grupo de piolhos.
“O Sr. Está louco, Sr. Artaud? E a missa?“
Eu renego o batismo e a missa.
Não há ato humano
que, no plano erótico interno,
seja mais pernicioso que a descida
do pretenso Jesus-cristo
nos altares.
Ninguém me acreditará
e posso ver daqui o público dando de ombros
mas esse tal cristo é apenas aquele
que diante do percevejo deus
aceitou viver sem corpo
quando uma multidão
descendo da cruz
à qual deus pensou tê–los pregado há muito tempo,
se rebelou
e munida de ferros,
de sangue,
de fogo e de ossos
Avança, desafiando o Invisível
para acabar com o JULGAMENTO DE DEUS.
J’AI APPRIS HIER
(il faut croire que je retarde, ou peut-être n’est-ce qu’un faux bruit, l’un de ces sales ragots comme il s’en colporte entre évier et latrines à l’heure de la mise aux baquets des repas une fois de plus ingurgités),
j’ai appris hier
l’une des pratiques officielles les plus sensationnelles des écoles publiques américaines
et qui font sans doute que ce pays se croit à la tête du progrès.
Il paraît que parmi les examens ou épreuves que l’on fait subir à un enfant qui entre pour la première fois dans une école publique, aurait lieu l’épreuve dite de la liqueur séminale ou du sperme,
et qui consisterait à demander à cet enfant nouvel entrant un peu de son sperme afin de l’insérer dans un bocal
et de le tenir ainsi prêt à toutes les tentatives de fécondation artificielle qui pourraient ensuite avoir lieu.
Car de plus en plus les Américains trouvent qu’ils manquent de bras et d’enfants,
c’est à dire non pas d’ouvriers
mais de soldats,
et ils veulent à toute force et par tous les moyens possibles faire et fabriquer des soldats
en vue de toutes les guerres planétaires qui pourraient ultérieurement avoir lieu,
et qui seraient destinées à démontrer par les vertus écrasantes de la force la surexcellence des produits américains,
et des fruits de la sueur américaine sur tous les champs de l’activité et du dynamisme possible de la force.
il faut par tous les moyens de l’activité possibles remplacer la nature partout où elle peut– être remplacée,
il faut trouver à l’inertie humaine un champ majeur,
il faut que l’ouvrier ait de quoi s’employer,
il faut que des champs d’activités nouvelles soient créés,
où ce sera le règne enfin de tous les faux produits fabriqués,
de tous les ignobles ersatz synthétiques
où la belle nature vraie n’a que faire,
et doit céder une fois pour toutes et honteusement la place à tous les triomphaux produits de remplacement
où le sperme de toutes les usines de fécondation artificielle fera merveille
pour produire des armées et des cuirassés.
Plus de fruits, plus d’arbres, plus de légumes, plus de plantes pharmaceutiques ou non et par conséquent plus d’aliments,
mais des produits de synthèse à satiété,
dans des vapeurs,
dans des humeurs spéciales de l’atmosphère, sur des axes particuliers des atmosphères tirées de force et par synthèse aux résistances d’une nature qui de la guerre n’a jamais connu que la peur.
Et vive la guerre, n’est–ce pas?
Car n’est–ce pas, ce faisant, la guerre que les Américains ont préparée et qu’il prépare ainsi pied à pied.
Pour défendre cet usinage insensé contre toutes les concurrences qui ne sauraient manquer de toutes parts de s’élever,
il faut des soldats, des armées, des avions, des cuirassés, de là ce sperme
auquel il paraîtrait que les gouvernements de l’Amérique auraient eu le culot de penser.
Car nous avons plus d’un ennemi
et qui nous guette, mon fils,
nous, les capitalistes nés,
et parmi ces ennemis
la Russie de Staline
qui ne manque pas non plus de bras armés.
Tout cela est très bien,
mais je ne savais pas les Américains un peuple si guerrier.
Pour se battre il faut recevoir des coups
et j’ai vu peut-être beaucoup d’Américains à la guerre
mais ils avaient toujours devant eux d’incommensurables armées de tanks, d’avions, de cuirassés
qui leur servaient de boucliers.
J’ai vu beaucoup se battre des machines
mais je n’ai vu qu’à l’infini
derrière
les hommes qui les conduisaient.
En face du peuple qui fait manger à ses chevaux, à ses bœufs et à ses ânes les dernières tonnes de morphine vraie qui peuvent lui rester pour la remplacer par des ersatz de fumée,
j’aime mieux le peuple qui mange à même la terre le délire d’où il est né,
je parle des Tarahumaras
mangeant le Peyotl à même le sol
pendant qu’il naît,
et qui tue le soleil pour installer le royaume de la nuit noire,
et qui crève la croix afin que les espaces de l’espace ne puissent plus jamais se rencontrer ni se croiser.
C’est ainsi que vous allez entendre la danse du TUTUGURI.
TUTUGURI
LE RITE DU SOLEIL NOIR
Et en bas, comme au bas de la pente amère,
cruellement désespérée du cœur,
s’ouvre le cercle des six croix,
très en bas,
comme encastré dans la terre mère,
désencastré de l’étreinte immonde de la mère
qui bave.
La terre de charbon noir
est le seul emplacement humide
dans cette fente de rocher.
Le Rite est que le nouveau soleil passe par sept points avant d‘éclater à l’orifice de la terre.
Et il y a six hommes,
un pour chaque soleil,
et un septième homme
qui est le soleil tout cru
habillé de noir et de chair rouge.
Or, ce septième homme
est un cheval,
un cheval avec un homme qui le mène.
Mais c‘est le cheval
qui est le soleil
et non l’homme.
Sur le déchirement d‘un tambour et d‘une trompette longue,
étrange,
les six hommes
qui étaient couchés,
roulés à ras de terre,
jaillissent successivement comme des tournesols,
non pas soleils mais sols tournants,
des lotus d‘eau,
et à chaque jaillissement
correspond le gong de plus en plus sombre
et rentré
du tambour
jusqu‘à ce que tout à coup on voie arriver au grand galop,
avec une vitesse de vertige,
le dernier soleil,
le premier homme,
le cheval noir avec un
homme nu,
absolument nu
et vierge
sur lui.
Ayant bondi, ils avancent suivant des méandres circulaires
et le cheval de viande saignante s’affole
et caracole sans arrêt
au faîte de son rocher
jusqu‘à ce que les six hommes
aient achevé de cerner
complètement
les six croix.
Or, le ton majeur du Rite est justement
L‘ABOLITION DE LA CROIX.
Ayant achevé de tourner
ils déplantent
les croix de terre
et l’homme nu
sur le cheval
arbore
un immense fer à cheval
qu‘il a trempé dans une coupure de son sang.
LA RECHERCHE DE LA FECALITE
Là où çà sent la merde
çà sent l’être
L‘homme aurait très bien pu ne pas chier,
ne pas ouvrir la poche anale,
mais il a choisi de chier
comme il aurait choisi de vivre
au lieu de consentir à vivre mort.
C’est que pour ne pas faire caca,
il lui aurait fallu consentir
à ne pas être,
mais il n‘a pas pu se résoudre à perdre l’être,
c‘est-à–dire à mourir vivant.
Il y a dans l‘être
quelque chose de particulièrement tentant pour l’homme
et ce quelque chose est justement
LE CACA.
Pour exister il suffit de se laisser aller à être,
mais pour vivre
il faut être quelqu‘un,
il faut avoir un os,
ne pas avoir peur de montrer l’os,
et de perdre la viande en passant
L‘homme a toujours mieux aimé la viande
que la terre des os
C’est qu‘il n‘y avait que de la terre et du bois d‘os,
et il lui a fallu gagner sa viande,
il n‘y avait que du fer et du feu
et pas de merde,
et l’homme a eu peur de perdre la merde
et, pour cela, sacrifié le sang.
Pour avoir de la merde,
c‘est-à–dire de la viande,
là où il n‘y avait que du sang
et de la ferraille d‘ossements
et où il n‘y avait pas à gagner d‘être
mais où il n‘y avait qu‘à perdre la vie.
o reche modo to edire
di za
tau dari
do padera coco
o reche modo to edire
di za
tau dari
do padera coco
Là, l’homme s’est retiré et il a fui.
Alors les bêtes l’ont mangé.
Ce ne fut pas un viol,
il s’est prêté à l’obscène repas.
Il y a trouvé du goût,
il a appris lui–même
à faire la bête
et à manger le rat
délicatement.
Et d‘où vient cette abjection de la saleté ?
De ce que le monde n‘est pas encore constitué,
ou de ce que l’homme n‘a qu‘une petite idée du monde
et qu‘il veut éternellement la garder ?
Cela vient de ce que l’homme,
un beau jour,
a arrêté
l’idée du monde.
Deux routes s’offraient à lui :
celle de l’infini dehors,
celle de l’infini dedans.
Et il a choisi l‘infime dedans.
Là où il n‘y a qu‘à presser
le rat,
la langue,
l’anus
ou le gland
Et dieu, dieu lui–même a pressé le mouvement,
Dieu est-il un être ?
s’il en est un c‘est de la merde
s’il n‘en est pas un
il n‘est pas.
Or il n‘est pas,
mais comme le vide qui avance avec toutes les formes
dont la représentation la plus parfaite
est la marche d‘un groupe incalculable de morpions.
“Vous êtes fou, monsieur Artaud, et la messe?“
Je renie le baptême et la messe.
Il n‘y a pas d‘acte humain
qui, sur le plan érotique interne,
soit plus pernicieux que la descente
du soi–disant Jésus-christ
sur les autels.
On ne me croira pas
et je vois d‘ici les haussements d‘épaule du public
mais le nommé christ n‘est autre que celui
qui en face du morpion dieu
a consenti à vivre sans corps,
alors qu‘une armée d‘hommes
descendue d‘une croix,
où dieu croyait l’avoir depuis longtemps clouée,
s’est révolté,
et, bardée de fer,
de sang,
de feu, et d‘ossements,
avance, invectivant l’Invisisble
a