Pai, te devolvo meu olhos
pois cansaram de juntar tanta luz
derramada sem fundamento sobre terra fugaz.
Mãe, te entrego meus cabelos
que o vento liberou daquele sulco
escuro em meu pensamento.
Mãepai,
língua que escava duas sílabas contrárias,
cante-me até um mar sem distâncias;
não deixe que de noite esqueça as estrelas
e fique conversando com as rochas,
como quem se apaga ao perder seu nome.
Recorda: um pássaro enredado
nas ramas do sentido
não consegue voar.
A luz de teus olhos voltou a nascer nas fendas do
monte. Te vejo, ao longe, recostado entre cerejeiras. E
ainda que não tenha baixado em mim a primavera, já
quero provar as bagas que brotaram de tua raiz amarga.
Uma mulher de rubores tristes me ensinou a estranha
hera que trepa ao redor do silêncio. Aprendi a me sentar e
esquecer. Mas já dividimos faz tempo demais a casa da
vertigem e a distância.
Quando voltar, nos será devolvido o humilde caminho.
Os pássaros do rancor terão poucas palavras para voar.