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Poema de Bianca Pataro

julho, 2018

 

Dela

o problema é o alvo riscado no peito atraindo flechas
devia ter nascido com um vaso na boca pedindo por rosas,
mas veio ao mundo com esse alvo riscado entre os seios,
implorando escancarado para ser imolado, atravessado, perfurado
e não é preciso ser arqueiro medieval para atingi-lo:
basta olhar fixo, em intervalos sucedidos por respirações profundas,
para a flecha perfurar a carne exposta na blusa aberta
e o sangue inundar de vermelho a pele e os lábios
e dela transbordar a dor ou a alegria em ser tocada.

Dele

o ar o sufoca de dentro pra fora
vem de lugar longe dentro do peito
entorna ao redor o que não pode conter
vaza em um grito rouco e enorme
roda na cabeça um redemoinho:
o ar que deveria levar, traz
o ar que deveria agitar o cabelo imobiliza a língua
falta de ar é a alma presa em ventania.

Deles

poderiam ter dito tudo em uma conversa breve
ou ficado mudos, com o silêncio nos olhos gritando
poderiam ter apenas anotado duas linhas no diário
[que nem possuíam, mas poderiam ter começado naquele verso final]
poderiam ter quebrado um copo ou lançado os discos pela janela
mas não havia mais discos na casa e os copos eram descartáveis como eles
e assim chegou o fim:
sem frases, sem cacos de vidro e com música digital.

Meu

o silêncio é uma estrada e a distância cavada pelo vazio é intransponível
cada passo dado é um desvio entre frases suspensas,
traçado de fuga aberto em picadas na longa vertigem erguida pelo nada dito
seria necessário novos pés para cruzar esse deserto mudo,
só tenho esses e o vazio cresce a cada curva,
passos dados não levam, retornam quando não há grito no horizonte
que oriente ou desaponte.

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