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Não sei ao certo que nome dar a isso, a essa sensação que me aflige já há algum tempo. Não sei se foi minha negligente procrastinação frente a maturidade que a vida vem me cobrando de anos para cá. Nunca fui um sujeito focado, definitivamente, se alguma alternativa fosse avistada, certamente seria adotada uma nova rota, um pequeno contorno que me permitisse aliviar minhas tensões. Não tem de carne? Pode ser de queijo. Não tem Brahma, me dá uma Skol, mesmo que não seja das geladas. Não tem picolé de limão? Me dá qualquer outro. A minha sede pela experimentação sempre esteve mais presente do que qualquer “gosto” pré definido, qualquer idéia pré-concebida. Definitivamente, se caso o fosse, seria um péssimo apostador… Talvez, por virar tanto em vielas e desvios, eu tenha desviado da rota correta para uma cidade. Mas quem sabe, no meio dos labirintos, desertos, eu não possa achar um harém cheio de congratulações por tempos de andanças tão incertas, tão à deriva.
Nunca poupei nada. Nunca poupei dinheiro, amigos, expectativas. Dado a isso, tive muito o que lamentar e muito o que comemorar e, para um sujeito pouco poupador, nada como comemorar. Lembro-me daquele ditado: a raposa não deve tomar conta do galinheiro.
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E se chegar um dia, quando as aflições não mais me flagelarem, talvez nesse dia a fumaça do cigarro não mais me satisfaça; O gole da cerveja talvez já não me caia tão bem. Então, talvez, nesse dia eu já não esteja mais entre vós; Quando este dia chegar, minha rosa exalará seu perfume e seus espinhos caírão por terra. Pois meu mundo é o das aflições e são elas o meu combustível, a sede voraz de vida. Como o poeta alemão, “Quereis mesmo colher minhas rosas?”
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A parte boa em optar andar a pé pela cidade, ou de bicicleta, ao invés de pegar um ônibus, quem dirá um táxi, ou melhor, quem pagará… É que eu acabo me deparando com cenas que disfarçadas de pouca importância me chamam grande atenção, ou pelo menos, me chamam de volta para o planeta Terra, do qual, volta e meia dou umas escapadas para dentro da minha cabeça.
Hoje saí da prova e resolvi voltar caminhando da Central para casa. No primeiro cruzamento já quase fui atropelado, pois minha cabeça ainda tava na questão de raciocínio lógico, queee pica, não resolvia “probleminhas” desde que havia saído do colégio, ou melhor, do 2° ano.
Continuei caminhando pela Lapa, mais úmida do que de costume. Parei comprei uma latinha e um salgado… Segui pela Joaquim Silva, onde encontrei um conhecido, com a cara e o cheiro da noite anterior ainda, mas um sorriso de orelha a orelha, ele acabou me contando que havia juntado 150 reais na Lapa esse final de semana, apenas com um pretexto de um broche, com o qual ele pedia 5 reais, e quem não tivesse que ajudasse com 1 realito.O cara tava todo bobo, e ainda falou “tá vendo só? ainda sobrou pra comprar a “demel” do domingão”…
Segui meu rumo, a cabeça dando voltas nas ideias, preocupações, coisas que vem no pensamento… Tava passando já pela Confeitaria Santo Amaro quando reparei um possível morador de rua que tenho visto com frequência aqui pelo Cosme Velho. Certa vez esse sujeito veio me pedir dinheiro, naquele dia, como hoje, não havia uma quantia com a qual eu pudesse fortalecê-lo, e o homem não gostou. Noutras vezes, quando passava por ele, o mesmo ficava me encarando. Mas dessa vez, quando eu passei pelo malandro, ele olhou nos meus olhos e falou: “Amanhã vai ser melhor, levanta a cabeça” E saiu fumando o seu cigarro…………..