Fábio Gomes é fotógrafo, formado pela Escola de Fotografia Popular do Imagens do Povo, na Maré, Rio de Janeiro, e é integrante do acervo mantido pela mesma instituição. Nascido no Rio de Janeiro e criado em Sāo Pedro da Aldeia, tem um olhar especial para rituais, festas populares, além do interesse nos grupos zeladores dos saberes tradicionais.
São Pedro da Aldeia é uma cidade da Região dos Lagos do Rio de Janeiro com em torno de 100 mil habitantes. A pesca artesanal é uma das principais atividades econômicas da região. São Pedro é uma das 6 cidades que circundam a Laguna de Araruama, um corpo de água diferente de uma lagoa por manter ligação com o mar. A água ali é mais salgada que no mar e a laguna é 100 vezes maior que a Lagoa Rodrigo de Freitas, sendo o maior corpo de água desse tipo do mundo.
Segundo Fabio: “A motivação inicial para este trabalho sempre foi mais emocional pelo local, pela minha infância, e pela admiração por esse modo de vida. Não tenho pescadores na minha família, nem sou, mas considero todos os que vivem perto daquelas águas como membros de um grande “cardume” e vejo na figura do pescador a essência daquele territorio. Além disso, as cidades dessa região são bastante conhecidas pelo seu apelo turístico, atraem muita gente no verão, e uma das consequências é a alta especulação imobiliária em áreas próximas à laguna. Isto não é de hoje, já acabou com muitas salinas e me incomoda à medida que a paisagem natural desaparece e os impactos, seja na gentrificação ou na poluição, quem sente são os nativos.”
As fotos de Fábio retratam a atividade de uma comunidade pesqueira nessa região onde ele foi criado em um período curioso: o defeso da tainha na Laguna de Araruama. Durante esse período, não se pode pescar a tainha, nem qualquer outra espécie de peixes, apenas crustáceos são permitidos. Essa interdição é regulamentada para garantir a reposição dos cardumes de forma sustentável e o ganho de peso das espécies, garantindo a conservação dos recursos naturais. Dessa forma, a pesca é retratada não pela sua realização, mas pela sua espera. Esse período de espera é preenchido por diversas atividades importantes, mas talvez não tão visíveis, como a manutenção dos barcos e das redes, a realização de melhorias estruturais nas colônias e de treinamentos diversos, como manutenção de embarcações, segurança e conscientização ambiental. As fotos retratam a importância dessa espera, e as atividades de preparação para a pesca, que também fazem parte da atividade, tanto quanto a pesca em si.
Os registros foram feitos ao longo de 3 meses, de agosto a outubro, tempo que dura o defeso. Nesse período, Fabio visitou diversas vilas de pescadores, conversando com os pescadores que estavam mais tempo em terra por conta da interrupção da pesca.
O trabalho de Fábio se baseia no conceito “Bem-querer”, estilo de fotografia documental criado por Joāo Ripper,um dos idealizadores do acervo Imagens do Povo e da Escola de Fotografia Popular, na Maré, Rio de Janeiro. A didática do Bem-querer tem como premissa a ética o respeito pelos sujeitos fotografados, é centrada no afeto e vem produzir novas narrativas, que quebram estereótipos e “histórias únicas”, limitadoras, no conceito discutido pela escritora nigeriana Chimamanda Adichie. Neste processo, a mesma filosofia é base para a fotografia popular, que entende os fotografados como parceiros na maneira que serão contadas suas histórias, sendo portanto, participantes do processo e da edição. Surge assim a ideia de fotografia compartilhada, que quebra com o paradigma de distanciamento e “captura” simples da imagem, sem retorno para o fotografado.
Segundo o fotógrafo: “Neste trabalho opto, portanto, por falar sobre histórias de quem não aparece tanto na publicidade do turismo e têm uma vida inteira ali, numa relação mais orgânica, genuína com aquele território. Pessoas que transmitem o conhecimento da pesca artesanal já praticada pelos povos Tupinambás há séculos e que dependem dos recursos naturais dali em equilíbrio pra poder seguir a vida.”
Veja mais do trabalho de Fabio Gomes:
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