“O Anjo Esquerdo da História” é uma composição de Gilberto Mendes que se baseia em um poema homônimo de Haroldo de Campos, que o escreveu em homenagem aos mortos do triste massacre de Eldorado dos Carajás, em 1997. Na ocasião, policiais militares cercaram milhares de sem-teto que realizavam um protesto em uma rodovia do Pará. Com 19 mortos, o momento é lembrado como um dia de luta e resistência pela reforma agrária popular no Brasil.
Gilberto Mendes foi um compositor brasileiro associado aos movimentos de vanguarda da década de 1960, principalmente ao grupo Música Nova. O manifesto surgiu em um contexto de discussão e convergência com a Poesia Concreta, então uma vanguarda recente proposta pelos irmãos Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari em São Paulo. Algumas de suas composições mais famosas são a partir de obras dos poetas concretos – como a obra do vídeo abaixo, interpretada pelo Coro da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP) sob regência de Naomi Munakata.
Além de Gilberto, compunham o grupo nomes como Rogério e Régis Duprat, Willy Corrêa de Oliveira, Damiano Cozzella, Julio Medaglia, Sandio Hohagen e Alexandre Pascoal. A Música Nova tornou-se um marco na história cultural brasileira, com desdobramentos para diversos campos musicais e artísticos. Rogério Duprat, por exemplo, seria conhecido mais tarde por seus arranjos para o cancioneiro popular que estruturaram as ideias musicais da Tropicália.
Mendes foi entusiasta das diversas vanguardas que eclodiram no século XX. Pioneiro no Brasil da música aleatória, concreta e de diversas outras formas de composição que ganhavam forma naquele momento, dedicou-se também ao ensino da música durante toda sua vida. A peça “O Anjo Esquerdo da História” traz consigo uma força política muito grande. Composta apenas para coro de vozes, com compassos que vão intercambiando de medida, a composição é quase como a força de um discurso coletivo, de uma atitude conjunta de luta. Quando se aproxima dos versos finais, as vozes vão ficando mais em uníssono, quase faladas – como num comício, num jogral.