Nada-menino, uma vez era. Nada, na medida em que passava e engrandecia, sentiu-se sozinho, quis conversar. Quis conversar, mas percebeu que ele, Nada, sozinho estava. Indagou:
– Por quê esta solidão?
Nada pensou e, ao pensar, concluiu:
– Se me chamo Nada e me sinto sozinho, procuro alguém e não acho… Creio que, outro Nada, não deve haver.
Mas Nada não se satisfez com a conclusão, ainda sentia-se sozinho e tinha vontade de conversar. Percebeu que sua resposta era ambígua pois, se ele, Nada, existia, Nada era algo, era um algo que se sentia sozinho, inclusive. Pela primeira vez, Nada se viu como presença, nascimento. Indagou-se, então, o como de seu acontecido, já que Nada, pais não tinha. Disse, a si:
– Se pais não tive, vim do nada. Mas, se vim do nada, nada havia.
O jovem Nada conclui, desta vez, que se ele mesmo havia vindo disso, disso que a ele tinha dado nome, origem e forma, havia outros nadas. Viu que ele, Nada, era um e todos. Que o silêncio que ouvia e a solidão que sentia eram, portanto, formas de sua forma, Nada, não o original apenas, mas a originalidade, a natureza das coisas mesmas. Em sendo a força-possibilidade, era positiva e feminina também. Pela primeira vez, Nada ouviu e, chorou.
A lágrima-Nada criou, nada. Gotinha de água parada na face de Nada. Nesta gotinha de água habitavam infinitos micro-organismos que, em provindo da lágrima de um jovem Nada eram, de modo idêntico, nada. Herdaram, simplesmente porque existiram, a forma da lágrima do Pai. Que não era forma alguma e todas, por isso.
(E não é que esses bichinhos também inventaram de pensar – já que não tinham visão da lágrima nem da face do Pai – que, se nada eram e do Nada vieram, poderiam, seriam, em uma intuição formal dessa existência, assim como o Pai, a possibilidade-tudo?! Daí os bichos viram a lágrima e logo quiseram colonizá-la, bem como aquele pedacinho de face do Pai.)