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Dia de sorte

outubro, 2025

 

eu quero ver quando Zumbi chegar

o que vai acontecer

Jorge Ben Jor

Sexta-feira. 6:40h da manhã. Chove. Chove muito. Frio e neblina. Mano, todo dia eu penso na merda que é acordar às 6h pra entregar pão, presunto, leite, pão de queijo, misto-quente de 25 conto, croissant, cappuccino. Qual foi cara! Qual a dificuldade que as pessoa têm de fazer seu próprio café da manhã? De ir na padaria com as suas própria perna? Bando de filho da puta nesse bairro bosta. Bairro de gente bosta. É claro que eu moraria aqui, mas por outros motivos. Diferentemente lá do São Pedro II, aqui não alaga quando chove, não tem barranco caindo e soterrando a gente, não tem polícia dando esculacho sem motivo em morador, não tem lixo nas rua atraindo rato e urubu ao lado do campinho de terra onde as criança joga bola com a bola toda remendada, não tem bala perdida achando o corpo dos meus broder. Mês passado foi o Cadu. Moleque brabo, sem caô. Corria pelo certo, era de boa com os morador tudo, nunca foi violento com ninguém. Quer dizer, nunca foi violento com ninguém que não merecia. Tinha passagem, umas duas, mas nunca ficou garrado muito tempo. Ainda cuidava da coroa dele que tá na cama desde que eu me entendo por gente. Aí semana passada o cara aparece com 5 furo de bala na cabeça e na nuca. Sabe o que os PM disse? Que achou o corpo dele depois de uma troca de tiro com os cara do alto e que o Cadu passou na rua no meio do tiroteio. Mano, 5 balas perdidas na cabeça? Sério? Alguém acreditou nisso? Parece que sim porque foi isso que o ESTV falou, na cara dura. Mas eu não, eu não sou burro assim não. Cadu foi executado. O nome disso é genocídio da juventude negra. Aprendi lá nas oficina que os cara da faculdade fazem lá no bairro. Sempre tem parada massa: dança, batalha de rap, slam, leitura, cursinho pré-vestibular, até oficina sobre horta comunitária já teve, mas eu gosto mesmo é dos filme que os cara passa. Mês passado teve o Marte Um, doido demais. O neguinho lá querendo ser astronauta, mano, maior viagem. Geral desacreditando o sonho do menor. Teve o Nós, maior sanguinolência e eu não entendendo nada, mas foi maneiro mesmo assim. No mesmo dia passaram também o Nada, da menina que não quer fazer nada. Eu fiquei viajando no que ela diz, de como a gente é obrigado a fazer alguma coisa pra ser considerado útil pelos outros, sacou? Mas útil pra quem? Eu só discordo dela porque eu quero fazer alguma coisa, não pra ser útil pra ninguém não, mas porque eu quero me formar. E eu vou. Eu quero ser útil é pra mim mesmo e pra minha mãe que tá até hoje trabalhando sem ajuda de ninguém, sendo mais útil pra família dos outro do que pra nossa própria família. Ultimamente a gente mal se vê, é só no bom dia de manhã e no dorme com Deus de noite. Pra ela eu tinha vontade de ser útil, de poder dar uma casa e um carro pra ela, tirar ela dos trabalho nas casa bacana da Praia do Canto e da Mata da Praia. Ninguém deveria tá tendo que trabalhar tanto assim nessa idade. Não que minha mãe seja velha, acho que ela não tem nem 60 anos. Mas mesmo assim. Eu sou diferente do meu irmão. Não vou abandonar nunca minha mãe. Ano passado foi maior neurose. Depois que o Allan saiu de casa ela ficou muito mal. Filho da puta foi lá pra BH atrás do pai e não deu mais notícia. Aí mamãe tentou dar uma de foda e tal, mas eu saquei que isso deixou ela baqueada. Logo depois eu vim com o papo que ia fazer audiovisual na Ufes. Aí foi foda porque ela ficou orgulhosa e puta ao mesmo tempo. Falava “Allisson Mateus do céu, como você quer fazer coisa de fazer filme? Vai ser um sonho te ver na faculdade, mas filme? Você tá doido? Isso por acaso dá dinheiro? Faz administração ou engenharia. O Marlon filho da Luleide tá ganhando mais de 7 mil na administração da ConstruMais. Seu tio podia te arrumar estágio lá ou nas obras que eles toca.” Tadinha da mãe, a preocupação dela eu entendo. Mas eu aprendi lá no cursinho do bairro que sonho não é coisa que deve ficar só nas ideia não, que a gente tem a mesma condição de estudar o que quiser e buscar nossa vida com a profissão que quiser, não só com as profissão que sobra pra gente nas favela, vendendo coisa, limpando coisa, entregando coisa. Todo trabalho já é um corre, isso eu boto fé, mas eu quero no futuro fazer algo que eu gosto mesmo. Por isso tô estudando, e lá na Ufes as coisa tão muito massa. Tô quase completando um ano já. Maior dificuldade esse início de curso, cheio das palavra difícil: é cinematografia na ponta esquerda, metanarrativa na ponta direita, estética kitsch de centroavante, tá doido. Conhecer a Bia foi até agora a melhor coisa, melhor até do que essas matéria lá falando sobre foto e história do cinema. Mas enquanto eu corro atrás de estudar preciso correr atrás também do dinheiro pra sobreviver. Vai vendo. Tendo que trabalhar com entrega de ifood, mano, maior merda. Manhã inteira nisso e quase toda noite também, parando a tarde pra ir pra aula. Mas era isso ou começar de vapor junto com os menor lá da praça. Ganhava mais e trabalhava menos, é certo, só que vivia ainda menos. Joca já tinha me dado o papo, a hora que eu quisesse era só dar ideia nele. Cadu, Freio e Jeffinho também, tudo trabalhava pro Paulista. E todos, menos o Freio, não chegaram nem aos 22. Eu queria era chegar logo aos 24 e não ser enterrado com caixão fechado. Joguei tanta pedra no trabalho da minha mãe e acabei fazendo quase o mesmo. Enquanto ela limpa o vaso cheio de merda dos playboy aqui de Vitória eu entrego as comida cara que vão encher o rabo deles de mais merda. Vira um ciclo sem fim essa porra. Sem fim não, porque pra mim vai ser passageiro, se Deus quiser. E foi tipo nessa de tá indo da padaria fazer entrega de bike em Jardim da Penha que eu fiquei com essas ideia. Eu aqui, já são 6:50h. Galera ainda dormindo, outros no corre igual eu. Cadu morto, minha mãe cansada, meu irmão aí no mundão, a Bia gostosa pra caralho, e eu aqui. Só esse café da manhã que eu tô levando paga quase 3 dias de trabalho meu. E ainda é no Brisa Oceânica, condomínio mais filho da puta que tem. Os porteiro tudo ignorante. Preto igual eu e racista ainda. Os morador eu nem falo. Dá vontade de tacar é fogo nesses arrombado. Branco tem mais é que tomar tiro na cara mesmo. Branco e PM. Branco, PM e porteiro de prédio de rico. Semana passada eu cheguei na moral, de dia ainda, toquei o interfone, falei por obséquio, e o morador filho da puta não quis descer pra buscar a comida. Mano, eu engoli seco, guardei meu orgulho no bolso e subi, porque não podia voltar com a encomenda. Beleza. Quando chego no 17º andar, ap. 1701, o cara ainda falou merda, falou pra mim que “é por isso que ninguém mais arruma trabalho decente, porque pobre gosta mesmo é de bolsa família e fica reclamando de fazer sua obrigação que é deixar a encomenda na porta do cliente”. Velho, o ódio que sobe nessas hora não dá nem pra descrever, cara. O cara me deu 1 estrela no aplicativo. Fiquei o dia todo pensando que tenho só 23 anos. Se for pra viver a vida toda assim é melhor pular da terceira ponte. Por isso que eu não vou viver a minha vida toda assim, isso é certo! Aí anteontem eu voltei lá. O porteiro me vê indo lá toda semana e toda semana ele só abre o portão depois de interfonar pro morador e ter a confirmação que eu não tô indo lá roubar. Dessa vez a pira foi outra. Quando eu tava me aproximando da portaria, tinha um casal entrando no prédio. Pedi tipo num impulso pra segurarem o portão pra mim. Eles olharam pra trás, deram um passo rapidão pra entrar no condomínio e fecharam a porta. Você tinha que ver a cara deles, mano. Tipo, o medo estampado nos olhos, parecia que eles tinha visto um bicho. Aí essa entrega era pra dona Elisa, senhora maior gente boa que tem lá, sempre me trata com educação e desce pra pegar os pedido dela. Ela sacou na hora que eu tava com uma cara abatida, tipo quando isso que é o normal da vida de alguém bate mais forte em um dia ou outro, tá ligado? Até perguntou se tinha acontecido alguma coisa, e aí eu já mandei na lata que não era nada demais não, só mais um racista que tinha saído correndo quando me viu se aproximar, coisa do dia a dia, é isso mesmo. Ela se desculpou e ainda concordou comigo, que no prédio ali a galera era complicada. Complicada? Sorri amarelo pelo gesto de boa vontade dela, e o peso na consciência fez ela me dar 20 conto de gorjeta. Hoje a entrega é no 6º, ap. 602. Esse eu não conheço, deve ser a primeira vez que pede lá na padaria. Mas tá de boa, hoje é sexta, mano. Vou fazer um esforço pra entregar até umas 14h e já meter o pé direto pro salão do Taíde, não vou nem pra aula. Hoje é dia de cabelinho disfarçado e platinado, daquele jeito, porque a noite vou sair com a Bia. Apesar da preguiça de toda manhã hoje eu acordei até com um sorriso na cara, além do pau duro igual uma Glock. Cheguei no salão e o Taíde já veio zoando “ah lá o mineiro, diz ele que hoje vai sair com uma gatinha”. Vai vendo, quem desacredita vai ser os primeiro a me ver subindo, menor. “Senta aqui, vacilão, vou te deixar o neguinho mais chave do Subúrbio hoje”. Aí sim, mano! O Taíde não tinha nem terminado e eu já tava me olhando no espelho e pensando: porra, hoje eu vou pra fuder, olha só o estilo do pai. Hãn, Bia vai ficar doida só de me ver. Saí do salão e passei no mercado pra segurar umas larica pra mim e pra coroa pro fim de semana. Uma coca, contrafilé, passatempo e miojo, além dos bolo que tava ficando velho na padaria e a gente podia pegar pela metade do preço. Mamãe não tinha chegado ainda. Escolhi a roupa, tomei um banho quente e fui me aprontar. Peguei o relógio que só usava em ocasiões especiais, o relógio que o Allan esqueceu quando meteu o pé de casa, calcei meu Reef novinho, perfume, e fiquei me olhando no espelho, imaginando o que a Bia acharia quando eu chegasse lá. A ideia era sair e dar uns amasso na rua mesmo, porque nenhum de nós tinha lugar pra ir ficar mais escondido. Mas botei a camisinha na carteira né, vai que. Nosso flerte já tava rolando tem tempo, mas só tinha rolado uns beijo atrás do Bob Esponja depois da aula de terça. Aí que eu meti a cara e chamei ela pra sair. Sempre foda né, menina rica e tal, artista e filha de artista, loirinha de moto elétrica, geralmente dá ruim quando vê uns neguinho magrelo igual eu. Mas ela também tava era amarradona, doida me querendo. Dia que se pegamos na ufes eu surrei de com força o pau nela, dentro do short, e ela adorou, ficou gemendo no meu ouvido. Pena que isso durou nem 5 minutos e ela disse que precisava ir embora. Quem sabe hoje o final vira um final feliz, né não? Saí voado e fui de busão pra deixar pra gastar com o uber só na volta. Aí é que meu humor desabou. Eu sabia que ela morava na Praia do Canto, mas só antes de sair de casa que ela me passou o endereço certinho. Rua Constante Sodré, 315, 16º andar, ap. 1601. Qual condomínio? Brisa Oceânica. Fiquei pensando como eu nunca tinha visto a Bia em quase 6 meses entregando lanches nessa porra de condomínio quase todo dia. Mas tranquilo, a noite prometia, nada de paranoia. Nem a chuva do caralho que começou a cair assim que entrei no busão podia estragar nada. Comemorei a sorte de pelo menos ela me esperar embarcar antes de cair. Cheguei na portaria com o corta-vento ensopado, o tênis também, mas tava valendo porque usei como guarda-chuva e ele protegeu o resto do meu traje, que mais importava. Foi eu chegar e o porteiro da noite, o mais escroto de todos, não esperou eu nem encostar no interfone. “Entrega pra qual apartamento, jovem?”. Entrega não, amigo. Interfona pro apartamento 1601, por favor. Pra Beatriz Hilal. Ele demorou mais que o normal pra fazer contato com um morador. Fiquei imaginando ele dizendo pra Bia “você tem certeza que esse moleque vai subir pra sua casa?”. Enquanto isso eu tentava enxugar o cabelo com a camisa, porque o casaco já tava encharcado. Foram alguns minutos que pareceram uma hora, na moral. Ficar parado em frente a um prédio de bacana não é uma situação muito agradável. Abriu o portão e eu entrei pela primeira vez ali sem ser pra fazer entrega pra alguém. Dei boa noite pra moça da limpeza, que retribuiu e ainda me elogiou. Cheguei em frente aos elevador. Antes que deixasse minha digital no botão, escutei: “Ei, ei, aí não rapaz. Elevador social tem dono. É pra morador, tá entendendo? O de serviço é o do lado”. Eu não tava com bag de entrega, nem com balde e vassoura de limpeza. Tava bem vestido, cordão de ouro, relógio maneiro, a tia da limpeza tinha acabado de falar como eu tava cheiroso. Eu olhei pro morador que tinha falado comigo. Reconheci, o mesmo filho da puta que me fez subir umas 3 vezes no 17º andar pra levar pão quentinho pra ele, ainda me chamando de preguiçoso. “Que é rapaz, tá olhando o quê?”. Ele não me reconheceu. Pra gente assim negro é tudo a mesma coisa. Não consegui pronunciar nenhuma palavra. Dei um passo pro lado e, tremendo, entrei no elevador de serviço, que tinha acabado de abrir. Em pouco mais de 60 segundos eu tive vontade de chorar, de pular daquele prédio maldito e, principalmente, de matar o gordo filho da puta, feio pra caralho, com um pau que eu aposto que ele mal consegue ver, que só deve conseguir meter numa mulher pagando, e que precisa então falar merda com os outros pra se achar alguma coisa. Cheguei na porta e a Bia já me esperava com um sorriso na cara, usando uma roupa amassada e já se desculpando: “Ei Mateus, entra e fica a vontade”. Enquanto eu processava o que ela dizia e procurava uma resposta, ela já emendou: “cara acredita que meus pais foram pra Guarapari do nada? Foi mal, ainda não tô pronta mais não demoro não. Que foi? Você tá bem?”. Em meio ao meu transe de ódio eu fui percebendo que Bia usava uma camisa longa, abaixo da virilha, que não deixava ver se ela estava de short ou de calcinha. Tá tudo certo, só peguei essa chuva e molhou um pouco meu corta vento. “Um pouco? Tá encharcado! Me dá que eu coloco na lava e seca enquanto tomo um banho. Quer beber alguma coisa enquanto me espera?”. Tô de boa, não esquenta. “Juro vei, é rapidinho”, ela disse ao voltar da área de serviço, se abaixando um pouco pra pegar o controle remoto na mesinha a frente e ligar a tv. Reparei que ela tava só de calcinha por baixo da camisa. Ela olhou disfarçadamente pra mim enquanto se abaixava. Já saquei que ela tava na maldade. Ao mesmo tempo que ela apertou o controle o prédio se apagou. Olhamos pela janela e parecia uma queda de luz em quase todo o bairro. “Que doidera! Mas não esquenta que tem gerador, só demora uns 3 minutos pra ligar. Vou correndo pro banho, me espera que não demoro”. Me deu um beijo gostoso, me segurando pela cintura, quase querendo deslizar a mão mais pra baixo. Cuidado no banheiro escuro, hein. “O chuveiro e a luz de emergência estão funcionando, não esquenta”. O tesão e o ódio são coisas muito intensas, cada qual a seu estilo. Enquanto eu ficava doido de desejo pensando que nem rolaria Subúrbio nenhum, que ela já ia tomar banho era querendo meter gostoso, uma ideia percorreu minha alma em 10 segundos: o gordo escroto mora no andar acima. Tá tudo desligado, inclusive as câmeras de segurança, até o gerador funcionar. Tenho 2 minutos. Já tinha sacado a cozinha, e minhas mãos tatearam na gaveta uma faca grande, pontuda, parecia bem amolada. Abri com cuidado a porta da casa da Bia, virei a esquerda e dei com a porta da escada, que já tava só encostada. Empurrei com a ponta dos pés e fui passando o ombro, subi dois lances de escadas na velocidade da luz, abri a porta seguinte com o cotovelo e a empurrei. Bati com as costas das mãos na porta do 1701. Eu me lembrava perfeitamente de qual apartamento era. Ele veio para abrir a porta já resmungando alguma coisa que mal dava pra entender, talvez já tivesse ligado pra recepção pra reclamar da demora do gerador em começar a funcionar. “ […] eu só espero que essa merda não […]”. Enquanto a porta se abria eu me lembrava do sobrinho do Miqueias, o Roncoio, que morreu com uma única facada dada no meio do peito, abaixo da caixa torácica, com a faca levemente curvada indo de baixo pra cima. O Roncoio, chamado assim porque só tinha uma bola, tava de talaricagem com a ex-namorada do cara que mandava no morro, e que nunca foi de mandar aviso. O Paulista chegou um dia no bar do Miqueias, abraçou seu sobrinho por trás, enfiando lentamente a faca no seu peito. Quando ela entrou toda, ele girou a faca com toda a força do mundo. Ninguém viu nada, ninguém falou nada. Depois, quando chegou o Samu pra fazer o socorro, o paramédico disse que a girada da faca pegou de uma vez só vários órgãos do coitado. O Carlinho Cai-n’água, mamado, passou o dia rindo e gritando pelo bairro: “Esse aí não come a mulher de mais ninguém, hein!”. Enquanto a porta se abria tudo isso passava pela minha cabeça como se o tempo tivesse parado. Dei um passo à frente, encurvei a faca, que subiu mais rápida que o elevador social. Girei-a, com uma força que não era minha, era de vários outros que vieram antes de mim, uns 160º graus para a direita. Eu me lembro bem das aulas de geometria, por uma única razão: minha mãe sempre disse que eu era um menino “360º, no ponteiro”. Pra entender o elogio que ela sempre me fazia, nunca esqueci dessa matéria. Puxei a faca e, por um milagre, nenhuma gota de sangue veio até mim. Em algum momento da vida precisava ter sorte, pensei. Dei um passo atrás, desci voando pela escada. A porta da Bia continuava aberta. Quando passei do batente, as luzes todas voltaram, imagino que as câmeras também. Lavei em segundos a faca na pia, e a coloquei na gaveta sem alarde. Sentei no sofá e terminei de curtir o torpor dos últimos minutos, que me levaram da humilhação à exaltação, passando pelo ódio, pela vergonha, pela tristeza, pela excitação e, por fim, pela coragem. Desenhei e relembrei mentalmente os meus passos: nenhum deles tinha deixado vestígio algum, eu não tinha tocado em nada fora do apartamento da Bia, que nem tinha visto que eu tinha me ausentado por menos de 3 minutos, ou seja, eu estive com ela por toda a noite. Ela então chegou na sala, só de toalha. “A gente tem de ir mesmo lá pro centro?”. Sorri com o canto da boca e ela deixou a toalha cair antes da minha resposta. Percebi que eu tava com o pau duro desde quando ela tinha me beijado. Gozamos juntos na cama dos seus pais. Ela, pela primeira vez na noite. Eu, pela segunda.

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